Sandra Reis

Sandra Reis

Quem sou eu

Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil
Minha vida não é uma linha reta, é cheia de curvas. Feita de encontros e reencontros. Gosto das palavras simples e humanas. Meu coração se expressa pelas mãos. Quando amo, me entrego. Sou toda feita de eros. Tantas pessoas e, no entanto, apenas esta pessoa. Meu Deus não tem religião. Ele está presente em todos os seres humanos, em toda a natureza. E todas as feridas cicatrizadas me ajudam a compreender o eterno.

sábado, 29 de setembro de 2007

A cor do sentimento ( Sandra Reis)

Essa luz úmida da lua
se manifesta nos detalhes.
Ouço-a em silêncio.

Por vezes ela flutua,
ascende...
mas não vai a grande altura.

Algo em mim transcende
Oscila, avança,
aprofunda.

Me surpreendo
por rumos inesperados.
Recorro a meu deus particular
e construo um altar.

Essa virada lúdica
não mais controla
meus sentimentos.

Meu pensamento
Não exige
Não censura
Não julga.

Tolera, frui, permite
e entrelaça
o caminho de quem amo.

Alquimia ( Sandra Reis)

Eu tenho um santuário secreto:
Está aqui dentro de mim.
Nele existe um amor tão grande,
sei que não terá fim.

Onde estavas, meu querido?
Em que estradas caminhei?
Segura minha mão
e me leve aos céus do seu coração.

Sim, estou amando.
Mais do que sinto, ele é
Eternidade, amor sem tempo,
que deixa uma doce saudade.

Abençoe, Deus meu
essa torrente de vida
que corre pela minha veia.

Abençoe o meu amado.
Fazei com que eu
doe mais que receba,
e essa paz me conceda.

Abençoe este sentir,
abençoe até a dor,
pois o que sinto é mais que amor,
é encontro de almas perene.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Viajante ( Sandra Reis)

Viajante

O amor me chama
a mim, que esqueci
ser um raio de sol,
que esqueci
ser minha alma um poema.

Resgatei meu coração.
Que saudade sentia
desse mistério de amar.


Ele sabe da essência do meu perfume,
do brilho da minha estrela,
e me liberta de todos os tabus.

E me contempla num mar de rosas
sem espinhos.
E abre as comportas
pois sou uma gota
e o que não sei, um oceano.

Lancei-me em seus braços
Já não caminho mais,
siderada, deslizo
nos seus espaços siderais.

sábado, 22 de setembro de 2007

Sobre a vida e a morte

Eu sempre admirei pessoas que têm habilidade de responder às mesmas situações de formas diferentes.

Passei a prestar bastante atenção ao comportamento tão paradoxal delas e isso me encantou.

Se antes me incomodava, agora as respeito.

Percebi que é necessário para a sobrevivência esse tipo de comportamento: ser, ao mesmo tempo, os opostos: amigo e distante, otimista e pessimista, enfim imprevisíveis.

E, conversando com algumas delas, compreendi que o que as fazia, ter mais de uma personalidade era a necessidade de se dar bem.

No meio dos meus cinqüenta e poucos anos, percebi que não podia mais errar comigo, com meus filhos, com meu trabalho e meus amigos. A autoridade deveria vir de dentro de mim. Há muitos caminhos a seguir, quando se precisa sobreviver.

Não tenho medo da morte, não me assusta. Mas quando meu filho me questiona:

-- Quem irá me proteger, depois de sua morte?

Então, o tempo me parece curto. É um caminho de incertezas onde eu sinto que é a minha última chance de fazer algo que realmente valha a pena nesta vida.

Só há uma coisa certa: eu não sei todas as respostas. É um sentimento de impotência.

Tenho uma amiga que nunca aceitou estar morrendo de câncer e sempre me dizia:

--- Por que eu?



Conheci crianças que são portadoras do HIV e que lutam pela vida com todas as forças.

Algumas, carentes de afeição, precisam que alguém as ame incondicionalmente.

E, então, penso como meu filho tem sorte por ser saudável fisicamente.

Temos alternativas, não precisamos pensar só de uma maneira.

O modo de ver sua experiência pessoal de uma forma descontraída e ao mesmo tempo

aceitando com alegria, sabendo que é aqui que podemos resolver tudo agora e não em outra vida, nos faz acreditar que as coisas são exatamente do jeito que deveriam ser.

Mas, além de se aceitar, é preciso buscar dentro de si mesmo todas as ferramentas necessárias para continuar não agindo e pensando de uma só forma. E aí que reside o problema. Nem todos são persistentes quando precisam ser.

É isso que gostaria de passar para meu filho. A flexibilidade ao lidar com as situações.

Gostaria de citar algumas frases de Tanussi Cardoso, esse poeta visceral, que fala da vida e da morte como ninguém:

--- " Quem morre antes? o morto ou seus objetos?"



-- " Sei não, acho que só vou morrer depois de mim."



Nascemos e morremos muitas vezes na vida. Morri um pouco quando minha neta

foi embora. Mas um Deus insiste em mim.

Ainda não passei por todos os estágios da vida. Ainda não cheguei ao estado final

de " sannyasin", a fase de " quem não ama nem odeia coisa alguma".

E, não sei, sinceramente se gostaria de chegar a este estágio da vida.

Ainda quero amar muito. Apenas descobri que o que antes tanto me agradava, agora já

não significa muito. São valores que estão sendo substituídos.

E são eles o bem maior que posso deixar para meus filhos.

domingo, 16 de setembro de 2007

Brumas do passado ( Sandra Reis)


Eu tinha vinte e dois anos e logo iria fazer vinte e três. Havia chegado em Genebra há poucos dias.
A única pessoa amiga que eu poderia contar, e que falava também o português era o
Sr Candeau, na época Presidente da Organização Mundial da Saúde, pai de um amigo de minha irmã.
Ele me recebeu na própria OMS e depois me convidou para ir à sua casa.
Lá, me apresentou à sua mãe. Para mim, ao longo desses anos, ficaram registradas nossas conversas naquelas agradáveis tardes.

Na frente da casa, tinha um jardim e estávamos na
primavera. As flores perfumavam o local com seu aroma. Mme Reefls me recebeu com um sorriso, convidou-me para sentar e me ofereceu uma xícara de chá.
Em seguida perguntou se eu me sentia feliz por
estar estudando lá.
Me lembro de ter tomado a decisão de ir, porque não me sentia feliz.
E agora, eu estaria?
Até viajar, eu fazia o curso de Comunicação, na Puc de Petrópolis, e não estava empolgada.
Eu morava em Teresópolis então.
Naquele momento, em Genève, tudo me parecia perfeito. Eu via apenas a beleza nas pessoas, o bem que existia nelas.
Era como se usasse óculos cor-de-rosa.
Disse isso para a senhora, e ela me fez ver que eu deveria ter sempre este hábito,
de não prestar atenção nos problemas que existem nos outros.
Embora eu estivesse diariamente com pessoas de minha idade. Eu tinha um carinho
especial pela minha velha amiga de alma jovem.
Ela era elegante, de gestos delicados, e tinha um intenso brilho no olhar.


Comecei a fazer um curso de recepcionista.
Houve uma ocasião em que algumas de nós seríamos escolhidas para recepcionar uma feira de automóveis.
A competição era grande.
Voltei à casa de Mme Reefls para uma segunda visita. Depois de tomarmos chá,
ela apontou para o cume do Mont Blanc e disse que a maioria dos alpinistas só
visavam chegar ao topo, não dando importância ao prazer da escalada.
Então, eu compreendi e procurei relaxar, fôsse qual fosse o
resultado.
Mas eu fui chamada para recepcionar o Salão Anual de Automóveis. Vesti um uniforme
vermelho com chapeuzinho, très chic. Estava um charme!

Na semana seguinte, subi o Mont Blanc de trenzinho e desci a pé com uma amiga francesa.
Ela foi minha única amiga na época. Tinha parentes que moravam lá.
Jovens fazem loucuras. Assim, depois de algumas horas, deixou de ser prazerosa
a descida!
Estávamos exaustas. Víamos os alpinistas descendo bem rápido.
Chegamos à noitinha lá em baixo. Mortas de fome e com vontade de fazer pipi,
entramos no primeiro restaurante que vimos. E tomamos uma sopa bem quente!

A minha turma era composta praticamente de inglesas e francesas.
Havia algumas americanas em menor quantidade. Eu era a única brasileira. E a única que não falava francês fluentemente.

Elas saiam muito pra se divertir. E achavam uma raridade eu ser virgem ainda com
23 anos.
O curso tinha aulas também de etiqueta, como andar, colocar um blaiser, além das
matérias como literatura e história.

Conheci um rapaz suíço que me levava para jantar fora sempre.
Um dia, resolvi ir a Paris de trem e não o avisei. Quando voltei, recebi um bouquê de rosas vermelhas enviado por ele .
Eu morava na Cidade Universitária.
Ele queria que eu ficasse em Genebra, não voltasse para o Brasil.
Mas eu não queria ficar longe de minha família.
Quando retornei de meu passeio, havia perdido meu quarto na Universidade.
Tive que morar em um pensionato alemão. Só tinha um problema: O banheiro
ficava trancado para banhos, o que só podia ser feito uma vez por semana!
Precisei pedir à minha amiga para tomar banho na casa dos tios dela.
E assim, pegava ônibus diariamente para “ tomar meu banho”.
Um dia, torci meu pé na rua. Caí no chão de dor e ninguém me ajudou!
Eu parecia invisível. As pessoas passavam por mim direto. Fui me arrastando para pegar um táxi e fui para o hospital. Não havia fratura, mas mesmo assim engessaram
meu pé.


Estava chegando o fim de minha estadia. Meu curso havia terminado.
Fui me despedir de Mme Reelfs, que havia aquecido meus dias com tanta ternura,
e pacientemente ouvido meus desabafos.
Ficávamos horas conversando e até hoje não assimilei a sua ausência.
Ela está lá, nas brumas do meu passado, que de quando em quando eu resgato
em minhas lembranças.

Caminhei de volta para meu quarto. Precisava fazer as malas.
Pensei na sorte que tive ao conhecer pessoalmente o Mestre Espiritual Krishnamurti dando palestras na Universidade. Já havia lido muitos livros dele antes de conhecê-lo.
Nada acontece por acaso.
Pensei nas minhas dúvidas, na timidez que me impediu de fazer novas escolhas.
Pensei nas pessoas que conheci e que de alguma forma suavizaram meu caminhar.
E me senti grata por ter tido essa chance mais uma vez.

Faltavam poucas horas para meu embarque e o fecho de minha mala rembentou! Não tinha a quem recorrer. Liguei para o Sr Candeau e pedi ajuda,
Ele foi rápido até onde eu estava, e começou a jogar fora o que achava que era bagulho: rolinhos de cabelo, cremes, revistas...
No aeroporto comprou uma mala nova para mim. E antes de me dar o último abraço,
me entregou um bilhete de sua mãe, Mme Íris Reelfs, que dizia:
“ Il est plus important de cultiver sés qualités que de lutter contre sés défauts”**.
Para mim, este é um bilhete atemporal. Um bilhete com um poder alquímico,
um amuleto que emite amor e que simbolizou momentos lindos e inesquecíveis.
E agora, quando olho para este bilhete, sinto que o tempo não passou. A nossa memória conserva eternizada, pelas emoções, o amor que transmitimos e que ainda
guardamos em nossos corações.

** É mais importante cultivar suas qualidades que lutar contras seus defeitos. (tradução da frase).

domingo, 2 de setembro de 2007

Momentos ( Sandra Reis)



É assim que meu filho o chama:” Momentos”. Seu nome mesmo é Scoob, mas como
são tantos os momentos bons que ele nos proporciona, acabou ficando o apelido.
Eu costumo chamá-lo de” Menininho” . Mesmo agora estando velho.
Tive a idéia de ter um cachorro para fazer companhia a ele, pois a irmã iria morar nos USA.

Há dez anos estávamos assistindo o filme “Sonho sem fim”, e havia um cachorro de orelhas compridas que voava. Minha filha disse:” Quero um igual a este!”
E eu fui buscar um, igualzinho.
Quantos dias de alegria! Ele adora fogos de artifício. Vocês sabem
de algum cachorro que goste de fogos? Ele gosta.
Se eu pudesse penetrar no coração de um cão e sentir o que ele sente quando seu dono chega. É como se um deus chegasse perto dele. É como se ele estivesse no paraíso.
E nós aprendemos tanto com essas criaturinhas de quatro patas.
Há pessoas que os desprezam. Não sabem quantos amigos fizemos por causa dele.
Essas pessoas fecham as portas dos sentidos. Renunciam à vida.
Muitas vezes, ele mexe o rabinho enquanto dorme. O que será que ele sonha?
Talvez com anjos de rabinhos, como ele.
E agora o vento soluça na minha janela como quem implora a volta dos risos.
Abro-a e deixo ventar dentro de nossa tristeza.
Isso não estava escrito: Que o tempo carrega o que é infinito.
Então me pergunto: Em que instante a alegria morreu?
Em que hora, meu cachorrinho, o silêncio feriu teu frágil corpo. Por que já não lates
mais. Já não corres como antes, nem tens mais força para chorar de alegria quando eu
chego em casa.
Não vou esquecer tua ternura e os dias que fizeram de nossa vida um sonho.
Peço aos céus que termine este jogo e que as fadas venham te beijar enquanto dormes,para que possas descansar no colo Daquele que nunca descansa.

O Flagrante Delito -- Sandra Reis

O Flagrante Delito

Sempre tive vontade de fazer aquilo.
Todos a quem contava, diziam:
--Menina, vê lá o que vai fazer, é arriscado!
Mas meu desejo crescia. E um dia não agüentei. Me armei de coragem e entrei naquele local. Olhei pra ela fixamente e pensei comigo mesma:
“ A vida é tão curta. Por que reprimir um desejo?”
Eu não vou ser a primeira, nem a última.
Fui para um canto, onde quase ninguém poderia me ver.
Meu desejo era incontrolável! Dei uma mordida nela.
Caminhei de volta aliviada.
Percebi olhares irônicos e dissimulados. Fingi que não era comigo.
Entrei no banheiro para escovar os dentes.
Me olhei no espelho:
-- Não! Isso não podia ter acontecido.
Fui desmascarada.
Meu nariz estava sujo de marshmellow.